“Embora fosse a obra que escrevi com mais facilidade, jamais escrevi algo com menos prazer.” C. S. Lewis
A afirmativa acima, feita pelo autor, é evidente a qualquer leitor atencioso logo nas primeiras páginas. Apesar do espírito sádico das cartas de Fitafuso a seu sobrinho diabo aprendiz, Vermebile, que muitas vezes leva o leitor aos risos, o pano de fundo negro e realista leva o leitor a um profundo nível de introspecção ao longo das situações a que o paciente é submetido em sua vida. O ponto de vista diabólico, construído nas páginas de Lewis, é por vezes tão óbvio que o leitor pode chegar a pensar, sem qualquer arrogância, que poderia ser capaz de escrever obra similar; o que é bom e ruim.
A essência da obra consiste no treinamento do jovem tentador Vermebile por seu tio, Fitafuso. O paciente de Vermebile, um humano, deve ser submetido a tentações inúmeras, conforme cada situação de sua vida, mediante análise minuciosa dos demônios de qual a melhor maneira, a cada instante, de leva-lo à perdição. Seja na igreja, no trabalho, no namoro... nada deve passar em branco pelos atentos diabos tentadores.
O Inimigo, isto é, Deus, é sempre mencionado, e a grande “graça” da leitura é toda a inversão de valores que compõe as correspondências de Fitafuso e Vermebile. O Inimigo é pintado de demônio, e o Pai das Profundezas, ou seja, o “dito cujo”, é o grande salvador.
“[...] se você não consegue fazer com que seu paciente fique longe da igreja, você deverá ao menos fazê-lo ficar profundamente ligado a algum grupo dentro dela” (p. 81).
Depois que se acostuma com a forma e o ritmo da leitura propostas por Lewis, a questão mesmo fica em como se encarar as verdades contidas página após página. O tom de alerta, embutido em cada instrução distorcida de Fitafuso deve ser uma lição de como devemos nos proteger das armadilhas cotidianas, das mais simples até as mais avassaladoras. O fato de os tentadores estarem interessados tão somente em uma coisa – que percamos a salvação – os leva a fazer de tudo, e de todas as maneiras possíveis, independentemente do que realmente achamos ou somos. Nossas tendências pecaminosas específicas e pessoais servem tão somente de matéria-prima.
“Há dois erros semelhantes, mas opostos que os seres humanos podem cometer quanto aos demônios. Um é não acreditar em sua existência. O outro é acreditar que eles existem e sentir um interesse excessivo e pouco saudável por eles. Os próprios demônios ficam igualmente satisfeitos com ambos os erros, e saúdam o materialista e o mago com a mesma alegria” (Prefácio, p. IX).
Nas edições mais recentes de Cartas de um diabo a seu aprendiz, um texto posterior feito por Lewis, intitulado “Fitafuso propõe um brinde”, encerra a história com uma formatura na Faculdade de Tentadores. Nada menos genial, curioso e de extrema importância.
Estejamos atentos e vigilantes contra as ciladas do mal (1 Pedro 5:8), dependentes, sempre, das forças de Cristo.
(Jônatas Duarte Lima, Engenharia Filosófica)